Fissuras em paredes de concreto: como evitar?
Ao se falar, discutir ou comentar a utilização do sistema construtivo Parede de Concreto, alguns temas são invariavelmente abordados de forma “suspeita”, criando-se alguns paradigmas, onde nem sempre as informações, sobre estes assuntos se tornam esclarecedoras, verdadeiras e confiáveis.
Abordamos nesta matéria um tema recorrente sobre a utilização do sistema Parede de concreto: Fissuras no concreto.
Convidamos alguns profissionais reconhecidos no mercado e que entendem profundamente sobre o assunto, e com eles buscamos as “verdades“ sobre este importante tema:
- Arnoldo Wendler – Projetista estrutural – Wendler projetos
- Alvaro Sérgio Barbosa Jr. – Tecnologista de concreto – Diretor da Red Engenharia
- Arcindo Vaquero y Mayor – Tecnologista de concreto – Consultor Abesc (Associação das empresas de serviços de concretagem)
- Carlos Alberto Chaves – Sistemas construtivos – Diretor da Signo Engenharia
- Francisco Paulo Graziano – Projetista estrutural – Pasqua & Graziano
- João Batista Rodrigues Silva – Sistemas construtivos – Diretor do IBTS (Instituto Brasileiro de Tela Soldada)
Para aquecer a nossa matéria, citamos o depoimento de dois importantes de profissionais do mercado, sobre o assunto:
Eng. Ademar Fiorini – Itaipu – “A ocorrência de fissuras é normal em qualquer grande obra de concreto. Elas surgem principalmente em decorrência da variabilidade das condições térmicas e das retrações e pressões sobre a estrutura, entre outros fatores.”
Eng. Paulo Roberto do Lago Helene – USP/São Paulo – “As estruturas de concreto são as mais duráveis. Resistem melhor a diversos meios agressivos e permitem construir reservatórios de água, estações de tratamento de esgotos, fábricas de celulose e papel, edificações e muitas outras obras impensáveis com outros materiais estruturais, como madeira, aço, cerâmica, etc. Houve um grande período da humanidade que essas estruturas de concreto eram consideradas eternas. Hoje sabemos que isso não é verdade e, mesmo muito resistentes, devem ser objeto de um programa de manutenção.”
1. Afinal, as fissuras que ocorrem são comuns? Fazem parte do processo? Temos que conviver com isto?
João Batista: A norma NBR 6118, permite fissuras no concreto, desde que sua abertura esteja dentro dos limites por ela estabelecido e, dependendo do meio em que a estrutura está inserido.
Em se tratando do sistema paredes de concreto esse tema ganha um destaque ainda maior.
Wendler : Não, temos milhares de unidades sem fissuras, portanto, não são inerentes do processo. Estão acontecendo , em algumas obras, não em todas.
Carlos Chaves: Todo sistema construtivo que envolve concreto pode apresentar fissuras. O importante é identificarmos o motivo do seu surgimento e sua importância: se é um problema estrutural ou apenas estético.
2. Por que ocorrem?
Graziano: Ocorrem por uma ação que tem como nome comum “coação”. Ou seja, a estrutura é forçada a coagir com a expansão ou contração volumétrica devida a duas causas principais: a. retração e b. variação de temperatura.
Todas dependem da resistência à tração do concreto e na sua ausência da armadura incorporada na parede, com o objetivo de que esta fissura tenha aberturas aceitáveis (até 0,3mm em geral).
O problema é que se a parte da retração ocorre no estado ainda plástico do concreto onde a resistência à tração é próxima de zero e por consequência a adesão entre o concreto e a armadura também são muito baixas, expondo sobremaneira a parede de concreto por não poder contar com a resistência à tração e nem com a armadura de aço.
Pode-se, em parte, diagnosticar que estas fissuras apresentam-se em grande parte nas regiões enfraquecidas pela presença de “conduites” embutidos, onde a capacidade de resistência à tração das paredes é bastante reduzida, em paredes de grande extensão sem juntas ou em paredes com baixa taxa de armadura horizontal. Uma outra causa é a existência de juntas frias entre a fundação e a parede, onde o desenvolvimento da retração da parede se dá em um momento diferente da fundação. Sabe-se que é desejável ter uma frente de trabalho executando a fundação bem à frente da execução das paredes, porém, esta defasagem no tempo pode causar alguns dissabores se não for devidamente planejada.
Wendler: Basicamente, retração do concreto. Não são fissuras estruturais e sim de acomodação.
Carlos Chaves:Alguns fatores executivos potencializam o surgimento das fissuras, além daqueles colocados pelos projetistas de estrutura Graziano e Wendler:
- Ausência ou ineficiência de cura (retração plástica nas primeiras idades, principalmente nos dias de ventos fortes – lembre-se do que dizia nossa avó: “o que seca a roupa é o vento e não o sol”).
- Falta de juntas de indução de fissuras (previstas em projeto) nas paredes mais longas.
- Posicionamento incorreto das armaduras e de eletrodutos, geralmente pela falta ou quantidade insuficiente de espaçadores.
- Impactos para os quais as paredes não foram dimensionadas, como por exemplo:
- Sistema de fôrmas inadequado que exige o uso de ferramentas pesadas durante a desforma.
- Vibrações excessivas com as paredes ainda “verdes”, como por exemplo, compactação de ruas próximas a paredes recém concretadas.
João Batista: No caso paredes de concreto, existem regiões que se tornam enfraquecidas devido a presença de conduítes, caixas de passagem e quadros do sistema elétrico.
3. O que fazer para evitá-las?
Graziano: Importantes medidas a serem tomadas estão sob a responsabilidade do tecnologista de materiais, que com a sua experiência recomendará o melhor traço paras condições ambientais (temperatura, vento, umidade, etc) da região na obra e desenvolverá um traço que melhor atenda estas situação.
Sabe-se que a adição de fibras sintéticas em pequena quantidade produz um benefício neste aspecto, talvez por permitir que a água em excesso saia com mais facilidade, evitando parte da fissuração plástica.
Uma cura adequada também seria desejável para que ocorresse a perda d’água mais controlada.
Depois que o concreto consolidou, atingindo uma resistência acima de 10MPa, pode-se dizer que convencionalmente a cura tem pouca eficiência e o controle da fissuração é mecânico, ou seja, evitado ou controlado pela resistência à tração e pela armadura existente. Sabe-se que é desejável ter uma frente de trabalho executando a fundação bem à frente da execução das paredes, porém, esta defasagem no tempo pode causar alguns dissabores se não for devidamente planejada.
Wendler:É necessário entender que temos que ter um concreto muito bem dosado, pensando não somente nos parâmetros de projeto estrutural, como as resistências, mas principalmente no bom funcionamento quanto a acabamento e retração. Em seguida, cura efetiva logo após a desforma. Envolver tecnologista de concreto e exigir cura.
Carlos Chaves: Contratar projetistas estruturais habituados ao sistema de paredes de concreto moldadas no local. Somente eles poderão antever a necessidade de juntas de indução, armaduras de reforços, etc. Mais do que um laboratório de ensaios, contratar com uma empresa de Tecnologia de Concreto que poderá, em conjunto com a concreteira, desenvolver o traço de concreto mais adequado para o empreendimento e para a região. Contratar concreteiras sérias e idôneas, com capacidade de atendimento e de desenvolvimento de soluções específicas para a sua obra. Utilizar fôrmas desenvolvidas especificamente para o sistema. Não promover adaptações em outros sistemas de fôrmas e cimbramento. Investir em treinamento. Uma das principais causas das fissuras é relativa à execução das paredes: montagem e posicionamento incorreto das armações, eletrodutos e demais peças “embutidas”, montagem (e principalmente desmontagem) inadequada das fôrmas, cura mal feita, etc.
Arcindo Vaquero: Recomendo fazer a cura úmida o máximo de tempo possível.
Na impossibilidade usar Agentes de Cura que atendam a ASTM C 309 com um consumo de 400 ml/m² fazendo testes de compatibilidade e aderência entre a superfície curada e os revestimentos desejados.
É desejável o uso de concretos auto adensáveis já tem menos água para perder alem de ter muito mais coesão.
Por fim aplicar a Norma que está em vigor e contratar uma Concreteira que tenha experiência e suporte técnico neste sistema construtivo.
Álvaro Barbosa : Importante: sem cura não pode ficar.
Adição de fibras melhora a retração inicial, mas não impede falta de água por deficiencia no traço de concreto, por ação de vento e etc.
O traço tem que estar adequado e a cura ser imediata: logo após a concretagem, pois durante o endurecimento vai precisar de toda a água do traço (temos que evitar a perda).
Estamos falando de cura durante as primeiras 24 horas e depois manutenção.
Lembro do assunto desmoldante de concreto para receber revestimento, no passado tinhamos problemas hoje a industria já tem produtos, com certeza temos também para cura, soluções eficientes e com custo mais menores.
João Batista: Ações do tipo; projetos bem dimensionados e detalhados com taxas de aço adequadas; identificação de aberturas nas paredes, a presença de tecnologista de concreto para elaborar e controlar o traço do concreto em função da região da obra; realizar cura do concreto conforme preconizado por norma e pelas boas práticas; usar fibras sintéticas para controle da retração do concreto na primeira idade quando a tela ainda não está trabalhando; entre outras, o aparecimento de fissuras praticamente será eliminado. As regiões com eletrodutos, caixas elétricas e caixa de disjuntores, deverão ser reforçadas com um tela própria para este fim (exemplo: BelgoRevest, da empresa Bekaert).
4. Que ações devemos tomar para as correções?
Carlos Chaves: Primeiro passo é identificar a sua causa e a sua importância. Para isso devemos contar com a experiência de projetistas estruturais e tecnologistas de concreto.
A partir daí, devemos identificar o melhor processo/produto para correção dessas fissuras. Para tal, podemos contar com a ajuda dos técnicos das empresas de produtos químicos para construção civil. Eles saberão quais produtos são mais indicados para cada tipo de fissura, além de treinar a equipe da obra na aplicação correta.
Wendler: Para fissuras de acomodação, escarificar, limpar e preencher com ACII.
Graziano: Fazendo uma boa engenharia de projeto, planejamento (envolvendo construtora/consultores e cadeia de fornecedores) e de uma boa execução.